terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Poemas de Livros Hipotéticos: Hecatônquiros. Poema 5.

5.

esmiuçando chega-se a nada,
ou talvez a um porto pobre e pequeno.

a separação trucida e assassina
os signos vivos.

há palha, trigo e joio,
mas nada é ganga
imprestável,

para quem sabe ler
tudo é imprescindível,
e o foco condena à vala comum,
o todo.

tudo vale no que é lido,
e mesmo no vale alvo do entre-linhas
pode-se mirar a mente
(desde que sem traves, travas e entraves)
uma rajada de chaves,
apocalipse revelado
sem desvelo exegético.

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Poemas de Livros Hipotéticos: Hecatônquiros. Poema 4.

4.

o poeta com a caneta luta.
socos diretos são letras precisas
sempre a três centímetros da ideia original,
para não explodir a página.

arruma-se versos,
mas não se pensa poesia,
como o pó não exita em pousar-se,
mesmo que lento, trasladando ácaros.

por mais que se burile o verso,
como na luta, o melhor golpe é aquele que se deu
sem piscar de olhos.

ali pode-se ver o poeta inteiro
num átimo de vontade.
e quem lê sente algo no ventre,
um soco vazio com punho de raio.

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Cinco horas da tarde*

do porto do silêncio zazen, parte a nau de osso e sangue: eu.
banhado em luz avermelhada
(enquanto desço a rua Sergipe),
penso se Maiakowski não escreve algum poema
que de alguma forma se reflete aqui em rubro crepúsculo.

singro o asfalto (tapete cintilante estendido morro abaixo)
entre meninas pré-púveres ensaiando a cópula em danças eróticas,
entre crianças frenéticas libertando-se do presídio escolar,
entre velhas sentadas nas varandas contemplando o oco de suas vidas passadas.

estranho ritmo, esse de cinco e poucos da tarde.
tudo parece reduzir a marcha,
e o que nos filmes é uma queda abrupta,
se dilata em um éon de Shiva.
uma liturgia aflora do âmago de tudo,
todos parecem parar de viver, e encenam
(é nessa hora que escrevo os meus poemas mais arquitetados).

avenida que divide Paripe. sinal vermelho.

fumadores de crack varrem o perímetro,
vorazes em busca de uma presa:
eles precisam de grana eles precisam precisam da pedra.
bares vomitam música alta e festiva:
os seres da noite começam a chegar e já tomam as primeiras cervejas.
carros são lavados desfazendo-se do pó do dia.
as ruas de baixo pululam de viaturas:
eles estão inspirados
eles querem ser notícia
eles querem aparecer nos tabloides televisivos
segurando um peixe miúdo e apresentá-lo como o maior traficante do cosmo.

os amigos trens aguardam na estação, vomitando pessoas.
eu, a nau de osso e vísceras, sigo a rua da estação,
e o mar de lava se oferece, cintilante,
tendo já a hóstia ígnea já completamente mergulhada.

um novo porto silencioso me aguarda:
colégio Barros Barreto,
espécie de retiro zen disfarçado de escola pública
incrustado na praia de Paripe.
lá, entre árvores, pássaros, ventos cantantes e cheiro de mar,
o Shotokan me ensina na dura prática,
o vazio que pare raios,
constantemente.

*Este poema é fruto de um exercício de criação proposto pelo blog http://gambiarraliteraria.blogspot.com. Nele eu descrevo, em 300 palavras, o caminho que faço a pé, todoas as Segundas, Quartas e Sextas, após uma seção de meditação em minha casa. Há uma versão menos enxuta do poema, que publicarei em breve aqui no DDD.

terça-feira, 30 de novembro de 2010

Seus dedos

seus dedos de exegese
querem dissecar meus poemas,
drenar-lhes a seiva,
e após mumificados, dissecá-los,
torná-los pó de mesa abandonada.

teu funil, para mim, é uma ameaça.
o teu imaginário é um bairro vazio.
o beijo dos teus olhos gela-me a espinha
como um bando neonazi num beco deserto.

você não é alguém com carne osso
e nome de batismo.
você é o canto mesquinho e frio do homen,
o ninho de víboras,
o Javé carrasco que a tudo que toca
torna estátua de sal.

você é aquilo com quem jurei nunca mais comungar
até que a morte me espalhe.

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

Sua Sombra

Sua sombra será vista na selva,
com detalhes em lama, merda e beijos esquecidos.
Você acabará, como tudo,
e o lobo uivará seu melhor uivo em milhares de anos.

As árvores dessa tarde dão um lento adeus ao seu cadáver,
que segue boiando na lágrima ensangüentada dos dias.

E os dias são de carros,
e os dias são de fodas loucas na cama velha,
e os dias são de tédio,
olhares vaziosde “que porra estou fazendo aqui?”

E os morcegos se fingem de cegos,
caçando mosquitos,
vigiando a lenta marcha do que sobrou do teu cadáver
soçobrante.

sábado, 30 de outubro de 2010

As FLores Miúdas de Harusame (pseudônimo com que assino meus poemas curtos)

Uma viatura singra
a janela do ônibus,
retilínea,

sangrando as minhas retinas
(curvilíneas janelas da cabeça).

Cretina!


O Coringa chama,
o Presidente atende.
BANG!



o vento varre o pó,
as árvores se curvam e aplaudem,
Primavera está passando!


o gato segue o rato.
por um tris
não perseguem a si mesmos.


flores gêmeas pingentes.
perguntas amarelas
para todas as respostas.


flores-sóis amarelas.
segredos pingentes
confessados por um fio
verde.

o suor indo pelo ralo
o sol indo pelo breu
a noite já sendo passado

a roda do ventilador
é uma revolução cubana
dedo em riste
rasgo urbano
raised fist!
um carro passou por cima do meu coração.
talvez por isso eu esteja pensando assim,
com cheiro de borracha e escapamento.
carburadores de letras,
vísceras de espuma,
coluna de pistão,
e a mente:
um prédio condenado
implodindo em slow motion
ao som do Dark Side of the Moon.


chão rachado
céu azul
primavera quente


primavera quente.
a única flor é o sol,
e já está indo.

Escritos mais recentes

BETH OVER

Beth Over era surda desde não se lembrava quando. Levava sempre os bolsos em pranto, sempre com um tanto, e um tanto samurai para o caso de um casual harakiri.
Já pensara em auto sepultar-se várias vezes, em ser puta duas vezes, mas em assistente o sepuku fica sem graça. Beth tem medo, mas disfarça. Além disso tem uns truques cabalístico-xamânicos, e uma poção que a deixa cheia de viço.

Beth Over é música de ofício, e oficia missas negras cheias de groove Black-ofídico na calada da noite.

Beth Over, rainha rocker destronada desde o berço. Deixou os tímpanos no seu primeiro terço, e agora segue a vida do avesso. Sua mãe vive condenando essa sua nova mania de tripas amostra, mas ela acha melhor assim do que ser outra ostra exoesquelética fascisto-lógica tímida e casta, antes janta do Paulouco (seu namorado) que santa do pau oco.

Beth não gosta de comer pouco, assim pelas beiradas. Sempre atacou de vez a feijoada. Seu Busdhidô é uma blitzkrieg desesperada, e sua banda tem pouco solo e mais pegada.
Beth tatuou no braço “some heads are gonna roll!” e vocifera isso em cada show you know? E Beth passa a bola para Crazy Paul que destila um solo blue tôo much slow. Beth faz dduas horas de zazen e uma cerimônia do chá antes de entrar no palco. E quando entra, recebe o coro, de assalto: Roll over, Beth Over! Roll over, Beth Over!


MANHÃ DE SÁBADO

a chaminé incensando os telhados marca o zero da minha solidão.
mariposa alimentando-se do céu no vidro da porta,
pássaros trilando solares,
iluminando os trilhos da luz antes mesmo que o sol desponte.

é preciso ser louco.
ser louco e sonhar,
sonhar e ser esperto,
mas não sonhar pouco.

há um túnel entre duas interrogações,
e o túnel é uma imensa exclamação.

as respostas não têm fim,
cada batida do coração é um infarto.

o leão devora a presa.
a mariposa, empanturrada do céu de vidro,
voa rumo ao incenso quente do pão matinal.

uma nota de Coltrane emerge de um abismo grave e trovejante.

eu ainda acho que a melhor resposta ao enigma do túnel
é a folha amarela suicidando-se numa tarde fresca,
aproveitando o tempo que se estende entre o galho e o chão
para dançar.


SUA SOMBRA

Sua sombra será vista na selva,
com detalhes em lama, merda e beijos esquecidos.
Você acabará, como tudo,
e o lobo uivará seu melhor uivo
em milhares de anos.

As árvores dessa tarde dão um lento adeus ao seu cadáver,
que segue boiando na lágrima ensangüentada dos dias.

E os dias são de carros,
e os dias são de fodas loucas na cama velha,
e os dias são de tédio, olhares vazios
de “que porra estou fazendo aqui?”

E os morcegos se fingem de cegos,
caçando mosquitos,
vigiando a lenta marcha do que sobrou do teu cadáver
soçobrante.

sábado, 23 de outubro de 2010

O BUDA E O CADÁVER

Um cadáver ilumina a minha estrada,
mantendo-a sempre aberta

E a mente,
nem morta nem alerta,
tomando quanquer reação como a certa

As rimas são acidentadas,
as montanhas são dentadas
e estar em curso é a meta

Um buda em chamas escorreu do fundo dos meus olhos,
agora tudo que tenho é um cadáver
escapando do meu punho cerrado como água

Beberão o leopardo, gota a gota,
até que brote do ventre da serpente
uma árvore de cacos de vidro
ensanguentados

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Um poema de Dom Pablo Neruda


El Pueblo

La sombra de este monte protector y propicio,
como una manta indiana fresca y rural me cubre:
bebo el azul del cielo por mis ojos sin vicio
como un ternero mama la leche de las ubres.

Al pie de la colina se extiende el pueblo y siento,
sin quererlo, el rodar de los tranways uebanos:
una iglesia se eleva para clavar el viento,
pero es muy vagabundo se le va de las manos.

Pueblo, eres triste e gris. TIenes las calles largas,
y un olor de almacén por tus calles pasea.
El agua de tus pozos la encuantro más amarga.
LAs almas de tus hombres me parecen más feas.

No saben la belleza de un surtidor que canta,
ni del que tresvaza florieciendo un concepto.
Sin detenerse, como el agua en la garganta,
desde sus corazones se va el verso perfecto.

El pueblo es gris e triste. Si estoy ausente pienso
que la ausencia parece que lo acercara de mí.
Regreso, y hasta el cielo tiene un bostenzo inmenso.
Y crece en mi alma un odio, como el de antes, intenso.

Pero ella vive aquí.

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

O câncer nosso de cada dia



postes são nuvens
e uma brisa primaveril
varre um prédio comercial

postes são postes
e a brisa varre o lixo da pressa
enquanto o prédio mantém-se inexorável
digerindo o caos da economia global

o cântico das vespas rasgando a face fogo do dia
fezes gângsters flores gatos
páginas amarelecidas boiando na água cotidiana
a seda azul do céu embalando berços de nuvens

alguns homens já desistiram de trepar
outros de fazer versos

o câncer mastigando ossos
os out-doors lambendo testículos
bocetas enormes triturando cruzes

e a grama espada verde
rompendo o cimento com gentileza invencível
& um pouco de tática

segunda-feira, 18 de outubro de 2010




tentou dissecar o vento
0000000oooooooooooooooe desolou-se

pois parado o vento não é

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

Transcrições fiéis de anotações repentinas no meu caderno


Sobre Kata, Zen e Cigarros
Ou
Agora percebo que escapei de uma cilada
Ou
Um dedo apontando para a lua não é a lua
Ou
Não é a colher que entorta, é você que entorta
Ou
Arremedo fragmentário de uma pequena canção de mim mesmo
Ou
No fundo há a Vontade de Potência
Ou
Um homem sem vícios é um homem fraco
Ou
Pequeno elogio do prazer
(Transcrição fiel de anotação no meu diário)




O kata é meditação em movimento, e o karate é o meu mais novo vício.

Acabei parando de fumar, e não tenho nenhum Deus para agradecer por isso, sobretudo porque não acredito num Diabo que me fazia fumar.

Não sinto remorso por ter fumado. Fumar é legal, mas o cigarro tolhia o prazer da minha prática de karate, que é uma das artes marciais que mais exigem do corpo para quem quer fruir mais plenamente dela. Um vício acabou sobrepujando outro.

Há coisas escondidas na prática do karate, sobretudo no kata, que só quem ama essa arte conhece, embora não saiba explicar, e nisso a influência do Zen é flagrante. Na verdade, o Karate e demais artes marciais japonesas não são apenas “influenciadas” pelo Zen. Elas, de certa forma, contém em si TODO o Zen. Não é à toa que os monges antigos praticavam a arte marcial no mesmo local em que praticavam meditação: o dojo.

Desde que comecei a praticar Karate e a estudar o Budismo, tiveram início uma série de mudanças no meu organismo e comportamento. Mas tais mudanças distam milhas e milhas das pseudo-mudanças dos convertidos evangélicos desesperados. Na verdade, passei a analisar a minha vida de forma muito mais lúcida, e uma das sacadas(insights?) que eu tive sobre mim mesmo foi justamente acerca das minhas investidas místico-religiosas. Uma bolha de sabão explodiu e eu percebi, num ploft!, que vinha me enfiando em religiões teístas (pan ou mono), motivado por um medo de mim mesmo, sobretudo do meu incurável ateísmo e materialismo. Mas as leituras budistas, de poesia da linhagem de Whitman, o Karate e a prática do Zazen (meditação zen), acabaram ajudando-me a re-conciliar-me de uma vez com a matéria, e sobretudo comigo mesmo. É importante pontuar que não se trata aqui de uma conversão, tampouco de um convencimento, como é no caso do cristianismo. Resumindo tudo em termos Zen: os livros, a meditação, e o Karate-do atuaram em minha vida como um dedo apontando para a lua, jamais como a lua “em si”, até porque nada existe em si e por si só, e o dedo é uma metáfora mutante, ou contingente (termo mais em voga).

É engraçado observar que meia dúzia de amigos meus converteram-se ao evangelismo (com ou sem igreja), adotando posturas monásticas (portanto hipócritas), enquanto eu, aos 26 anos registro num caderno de repentes (mon coeur mis a nu) o meu casamento definitivo com minha humanidade/animalidade. Ou seja, reconhecer os limites da existence e agir dentro deles, valendo-me de táticas e estratégias plausíveis (e nisso eu sou um tanto pragmatista).

Veja o caso do cigarro, nenhum dos motivos costumeiros me convenceriam a parar: medo da morte, inferno, punição, consciência, um infantil e jesuítico “amor à vida”, medo do sofrimento/dor, ET Cetera. Eu só parei defato, de forma natural (no sentido taoísta), quando topei acidentalmente com um novo vício, que me proporciona um bônus imenso (prazer), e absolutamente nenhum ônus, e aqui eu me refiro ao Karate, já que nem mesmo o Zen me impediria de fumar, porque além de eu não seguir um “manual definitivo de conduta Zen” (o que a Bíblia é para os cristãos), o mesmo não se assenta sobre bases ético-moralistas. Na verdade, quem está habituado à hagiografia cristã, se espantaria ao dar uma breve olhada nas biografias dos antigos mestres zen-budistas. Muitos deles eram bebedores homéricos, fumantes compulsivos, quando não comedores de ópio, haja vista Milarepa, um eminente mestre zen, e ao mesmo tempo espécie de proto-beatnik.

Outro efeito espantoso do karate sobre mim, em especial a prática do kata, é uma crescente consciência de mim enquanto CORPO, do que decorre uma progressiva descentralização da consciência, o que me afasta mais e mais do espiritualismo, idealismo, e do culto romântico e daninho ao que nos acostumamos a chamar de “mente”, ou pelo menos uma espécie de “esticamento” da mesma. Quando estou num treino de luta com contato (jiu-ipon-kumite), tenho a nítida impressão de que a minha “mente” se espalha por todos os meus membros. De certa forma, não penso só com a cabeça, mas também os meus membros possuem formas particulares de consciência. E isso é puro Zen, pois aí temos a velha questão da “sede do pensamento” (a mente está mais na cabeça ou no pé?).

Tenho tirado cada vez mais filosofia prática da luta. A luta se assemelha à vida e à arte. Em ambas é urgente o golpe certeiro, ou a esquiva eficaz (mais freqüente).

Quando eu olho para trás, vejo um homem que dos 0 aos 20 anos ignorava que tinha pés, mãos, braços, coxas..., era como se uma nuvem espessa me acompanhasse para onde quer que eu fosse. Uma nuvem que cobria tudo do pescoço para baixo, com exceção de uma clareira no pênis. É claro que quando eu era garçom usava todos os meus membros. Mas quem disse que o trabalho foi criado para nos deixar mais cônscios de nós mesmos? (e aqui eu fico um tanto marxiano).

Fiel aplicador do princípio de wu-wei que sou, não pretendo com a publicação destas notas um tanto apologéticas prescrever modos de vida (liberanos Domine!), até porque não encontrei nada que se possa chamar “modo de vida”, sendo esta um fluxo constante impossível de represar em módulos ou fôrmas. Apenas, ao modo de Whitman ou Thoreau, compartilho com quem lê este blog, anotações sobre a minha “Estrada Aberta”. Sobretudo sobre os efeitos que o princípio do prazer (ah, Fourier, porque te abandonaram?!) e autenticidade têm exercido sobre meu ser/perceber/estar-no-mundo, sobre minha existência. Mas como creio que todo discurso traz implícitas marcas de intencionalidade, admito que algo permeia as entrelinhas destas notas: uma tentativa de mostrar o quão daninha pode ser a opção pela conversão religiosa e tentativas desesperadas de fugir do que nós realmente somos, macacos pelados.

Rafael Medeiros
24/09/10
03:57h

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Algumas flatulências recentes

O CASTELO
Para Franz Kafka, meu irmão espiritual


encontraram um casal
recheado de cocaína e êxtase
misturados ao resto do recheio bom-moço
de um avião.

ambos bolivianos.

o povo,
com a mente recheada por lixos policiólatras
como CSI e Na Mira,
sentem reforçar-se dentro de si
o velho pré-conceito
contra tudo que não é branco-anglo-saxônico.

esses latinos são mesmo uns degenerados!
sempre eles, são eles o mal...

:são?

para mim,
90% do contingente da mão de obra global
é composta por afro-descendentes,
indio-descendentes,
e tudo que os donos desta sucursal oval
consideram sub-raça.

ora,
sendo assim,
por que seria diferente no tráfico?

afinal,
é amplo o leque dos subrmpregos
destinados a nós: sub-raça desta subamérica

mas de algum lugar do Castelo do Simulacro,
os Patrões controlam todas as filiais.

são vários os subempregos,
mas os patrões são os mesmos.


Sobre Conjuntos


Havia o conjunto da minha vida
Como na matemática
E o conjunto da santa santa litera-
tura Beat,
e havia o Ginsberg, e o Lawrence,
e eles eram elementos do
conjunto Beat,
e eu era o elemento do conjunto
de minha vida
e eu queria refletir
e refletia,
mas não dominava
o jeito argumento
o discurso prosa
a filosofodissertologia,
escrevendo
eu era tão articulado
quanto um flamingo
ou o Albatroz de Baudelaire,
e haviam tantas flores, e o mal
germinava em mim tantas flores
e eu queria tanto ser uma flor do mal,
mas meus poemas saíam so so so
extensos.
Foi então que se deu a Operação Matemática:
O conjunto Minha Vida
Chocou-se com o conjunto Literatura Beat,
E num passe de lógica,
Nossos elementos intercederam-se,
E eu descobri um troço chamado “condesnsação”,
Então em passei a comprimir milhares de informações
Em espaços exíguos como o cafofo em que eu moro,
De repente minha poesia já não era arte,
Era campo minado,
Cápsulas de explosão sígnica,
E
Lá se ia
Qualquer possibilidade
De escrever para os “simples”
.


Sobre Cavalos e o Ser

eu tenho cinco cavalos,
todos doidos,
são de fogo, e suas crinas são fumaça

se alimentam de beijos e ofensas,
belas praias, cigarros, livros,
e suas ferraduras são a voz de Hank Williams
numa noite sem lua.

por onde passam meus cavalos
fica impressa a marca da sede,
e qualquer água falsa de religião evapora
com o simples mirar dos seus olhos de lava.

nem em sonhos, meus amigos,
nem nos reinos oníricos estou livre
dos meus cinco cavalos doidos,

e vez por outra
um deles sopra-me ao ouvido:

“se nós morrer-mos, Rafael, morre tudo que tu és.”


Brahmastra

Parabólicas captam o éter memórias do último apocalipse,
transando cores estroboscópicas de um soturno amanhecer.
Quando será que a Virgem casará com o Cavaleiro de Alumínio,
sendo que milhões de anos se passaram,
e ao agora o Rei de Copas resolveu dar a sua mão em casamento?

Ah, alucinam-me as estrelas à noite,
e casa litro de hidrogênio que delas sorvo!

Cubro-me de fogo, minha carne ferve,
mas é preciso realizar tal batismo toda noite,
com cigarro, jazz e álcool,
para que os cadáveres não se acumulem.

O Grande Olho paira no céu,
e acho melhor ocultar-me com a capa de breu
antes que as garras da tarântula me aprisionem
na teia do tormento eterno.

Haverão asas, ainda, de fúria indomável,
singrando os céus de chumbo, com garras de vespa,
e Espaço vencerá Tempo, com dardos embebidos em mescalina,
na maior e mais silenciosa de todas as batalhas.

sábado, 4 de setembro de 2010

200.

Vou cantar a canção dos desvairados
Dos que não piscam
Dos que, em meio à cultura do alerta
Permanecem voluntariamente desavisados.
Vistas desanuviadas, aurora que antecede o galo,
Eu vou provar que nem toda noite
Torna os gatos todos pardos.
E vou trotar num furacão de fogo,
Sobre a corja em chamas dos simples e abnegados.
Dá-me vinho, demônio conjurado,
Senão rompo teu círculo, esmigalho teu selo,
E voltarás a tua torre humilhado!

terça-feira, 3 de agosto de 2010

110.

cuidado com a sua língua desregrada
sua boca desdentada
de barragem arrombada.

minha loucura é regrada
racionada direcionada canalizada
friamente calculada.

eu vou bem
vou vivendo em cada esquina
cada dia mais convicto
da inviabilidade da rima

ou pelo menos da sua acidentalidade
como uma anti-sina.

sinto-me um vale interno
um intervalo
como um poste deitado

com fios ocos que conduzem nada.

sábado, 31 de julho de 2010

quinta-feira, 29 de julho de 2010

Caros amigos que sorvem o perfume destas flores tão débeis e assimétricas. Andei afastado da internet por um tempo, pois estava empreendendo uma leitura de um certo Russo atormentado (quem sabe, sabe). Agora, emerso do inferno, após conhecer demônios terríveis (ah, Ivan Karamazov!). Volto a navegar nesta nau pirata. E por falar em pirata, aí vai uma citação de um legítimo!

"Não estamos interessados num retorno ao primitivo, mas num retorno do primitivo, atendendo a que o primitivo é o reprimido. HAKIM BEY"

quarta-feira, 30 de junho de 2010

Um Sonho Vívido


Uma noite dessas eu sonhei que estava imerso numa missa. O padre era Robert Johnson, e em um dado momento ele erguia as mãos e dizia: "o poder não está nos céus, nem tampouco encerrado no Estado. Ele está no meio de nós!"
Todos diziam amém.
Então eu olhei para o lado, e entre os participantes da missa estavam caras como Bakunin, Max Stirner, Krishnamurti, Barão de Itararé, e dezenas de bluesmen (vivos e mortos).
Eu dei uma sacada neles todos, e depois tornei a olhar para o altar, e lá estava o deus Exu, com as mesmas roupas do Robert. A lâmina da sua cabeça perpassava o chapéu.
Percebi que as paredes da igreja (que era repleta de ba-guas) , começavam a trincar, quando o pó começou a cair sobre mim, eu percebi que o teto também estava nas últimas.

Exu-Robert olhou para cima, e começou a executar uma sequência de tai-chi, com a serenidade de um Bodhisatwa. Após executar todos os movimentos belamente escadeados, o estranho padre desapareceu no ar, deixando suspensa uma fumaça vermelha, que aos poucos formou uma frase:

"Fujam, meus irmãos, pois tudo é movimento, e fugir é o que nos resta. A esquiva é mais sábia que a valentia."

Todos começaram a correr, menos um blues man cego, que sentou num escombro e começou a executar uma versão lindíssima e desesperada de I Sit And Cry (The Blues). Eu corri como louco em direção à porta, esquivando como podia dos escombros e pilastras que caíam. Quando alcancei o lado de fora, olhei para trás, e vi o Blues Man Cego ser esmagado por um pedaço enorme do teto, e depois tudo veio abaixo. Eu virei-me, intencionando trocar umas palavras com aquela rapazeada que estava na missa, mas o que vi foi o semi-breu do meu quarto.

Eu estava na cama, imerso na confusão mental proustiana que precede um sonho vívido. Tateei na penumbra, sentado na cama, catei a carteira de cigarro, o iPod, e selecionei I Sit And Cry...

Acendi um cigarro, e esperei o dia calrear. Eram quinze para as quatro. Em quarenta e cinco minutaos eu deveria estar a postos, no ponto de ônibus.

RM

quarta-feira, 23 de junho de 2010

"O escritor deve naturalmente ganhar dinheiro para poder viver e escrever, mas não deve em nenhum caso viver e escrever para ganhar dinheiro... O escritor não considera de forma alguma seus trabalhos como um meio. Eles são objetivos em si, são tão pouco um meio para si mesmo e para os outros que sacrifica, se necessário, sua própria existência à existência de seus trabalhos... A primeira condição da liberdade de imprensa consiste em não ser um ofício. Mais que nunca é oportuno agora brandir essa declaração contra aqueles que pretendem sujeitar a atividade intelectual a fins exteriores a si mesma e, desprezando todas as determinações históricas que lhe são próprias, dirigir, em função de pretensas razões de Estado, os temas da arte. A livre escolha desses temas e a não-restrição absoluta no que se refere ao campo de sua exploração constituem para o artista um bem que ele tem o direito de reivindicar como inalienável. Em matéria de criação artística, importa essencialmente que a imaginação escape a qualquer coação, não se deixe sob nenhum pretexto impor qualquer figurino. Àqueles que nos pressionarem, hoje ou amanhã, para consentir que a arte seja submetida a uma disciplina que consideramos radicalmente incompatível com seus meios, opomos uma recusa inapelável e nossa vontade deliberada de nos apegarmos à fórmula: toda licença em arte."

KARL MARX

17.




o corredor era estreito,

e só deixava passar meio homem.

mas a outra metade, a sem cérebro,

andava com rebeldia e erraticidade,

era difícil domá-la à distância.


haviam sete meios-homens na entrada ,

e doze jaziam, inertes, na outra extremidade.


o corredor era uma serpente,

e à esquerda do seu coração um demônio dormia

de olhos abertos, em pleno sammadhi.

da sua boca minava um filete de saliva,

e quem o beijasse com furor adquiria um corpo de centauro,

e ossos de fogo.


haviam sete metades inferiores de homem na entrada do corredor-serpente

e doze jaziam, inertes, no outro extremo,

mas um relinchar de centauro perpassou os átomos,

e todas as metades de homem bateram em debandada,

com asas de cisne.


RAMMED BLACKWOLF

sábado, 19 de junho de 2010

Pseudo-xamã-urbanóide-suburbano



Meu amigo diz que agora é xamã,
Ele se ligou no Castañeda
E diz que agora quer encontrar o Santo Graal.
Meu amigo leva fé numa pseudo-História
Que bota tudo em ordem na linha do tempo,
Que bota tudo numa linha bem fácil de entender,
Um rio sereno e luminoso que desemboca num futuro feliz.
Eu não sei como meu amigo pretende arrumar tempo para matar lagartos
e costurar-lhes a boca enquanto fuma um cachimbo de alguma erva super-forte,
Eu nem sei se o meu amigo aspirante a Sanat Kumara tem mesmo estômago para realizar operações mágicas que envolvem sangue e tripas.
Na verdade eu acho mesmo que à primeira visão estranha com o canto do olho meu amigo vai dar no pé e rezar o terço assustado no canto do quarto.
Mas o que eu não entendo mesmo,
É como meu amigo pretende arrumar tempo para fazer todas as coisas que um xamã precisa fazer.

Minha cosmovisão sintetizada

"A vida é uma puta sã que finge ter sífilis a alguns desafortunados por puro sadismo."

RAMMED

sexta-feira, 4 de junho de 2010

O Veneno*

Ricardo sorvia todo dia
Uma dose do Veneno,
Que o matava lentamente,
E em um ano o exterminaria.
Por que tomava? Não sabia,
Sua dama também não,
Mas tomava, também ela,
E seu Flavinho, ano que vem,
começaria.

***

"A Virtude", como chamavam a bebida,
Pertencia ao Supremo De Cada Um,
E o deles era Carlos:
Homem forte, rosado, robusto,
e sobretudo risonho.

***

Um dia, meio do ano,
Organizados, embandeirados em bandos,
Um grupo seduziu
Ricardo e família.
O plano engenhoso o empolgou
E fez arder seu coração:
Matar todos os Supremos de Cada Um,
E roubar o "Remédio",
Que guardavam no armário da cozinha.

***

Não me delongo no processo,
Pois já fisga-me o sono
E escasseia-me o vinho.
Mas o fato é que fizeram,
Cumpriram o programa:
Deram cabo dos chefes,
E roubaram os venenos.

***

Mas ao fim e ao cabo,
Algo aconteceu de interessante:
Todos empossados do Veneno
Decidiram continuar tomando-o.
Todos, menos Ricardo,
e família,
Que a contragosto dos Líderes do levante,
Estourou a garrafa malsã
Na cabeça do adormecido Supremo,
E ateou fogo na sua casa,
Com ele, veneno, e tudo.

*Não, eu não estou atravessando uma crise criativa ou coisa do tipo. Mesmo porque não me vejo como um escritor profissional ou coisa do tipo. Resolvi re-publicar este conto por dois motivos:
1. Para que os que não o leram, leiam.
2. Para expliciatar um pouco da minha visão política, visto que estamos na iminência de eleições.

quarta-feira, 2 de junho de 2010

14

Coubert.

Não, amigo, não há nada
Além de terra e céu e gases.
O fogo queima e a água encharca,
A merda fede e o soco parte o osso.
Se queres graça,
É aí que deves procurar,
Entre os dois portos incógnitos
Que tanto assombraram Pascal
E o fizeram cagar nas calças
E rezar o terço de olhos esbugalhados.
Não há alma,
Não há Deus,
E a mente é tão material quanto o dente careado.
A salvação está em ilhas esparsas flutuantes,
E o espaço entre elas é tédio, cansaço e desespero.
Mas agarra-te ao pouco que tens,
E goza o pouco que és.
Pois como bem disse o Poeta,
Querer mais é perder até mesmo isso.
O resto é metafísica.

terça-feira, 1 de junho de 2010

13

Chove na minha cabeça
(não na alma),
e eu queria partir o céu em dois
e comê-lo com manteiga
tomando goles sucessivos de vodka.

Esqueci o bom-humor na cama.
Tenho medo de que essa bad-trip dure para sempre,
mas é melhor ser honesto
que ser tristemente alegre.

Cobram-me a testosterona, macheza, valentia.
Cobram-me sobretudo que eu seja o libertino que não sou,
E embora não seja religioso ou moralista,
Vou devagar com os anseios de provar aos amigos
o quanto sigo os passos do velho Buk.

O que o Buk acharia desses imitadores baratos?

Esqueci o bom moço na cama,
e se não cuspo no primeiro crente hipócrita
que cruza o meu caminho,
é por amor à minha própria integridade física.

Eu queria partir o céu em dois
e comê-lo com manteiga,
mas um poema com pouco prumo
à prova de pontos
com pontas soltas alquebradas
é tudo que tenho para analisar o meu ser,
para canalisar meu poder.

Repente

"De onde você menos espera, é daí que não sai nada." (Barão de Itararé)

É engraçado como as pessoas lançam suas agulhadas sub-reptícias, crentes de que não serão detectadas pelo interlocutor.

Cuidado com os vampiros, eles estão loucos para saltar em seu pescoço num frêmito febril-convulsivo ao menor sinal de potência da tua parte!

Rafael Medeiros, deficitário de testosterona.

Algo sobre Cassandra

A mitologia grega conta como Cassandra e o seu irmão gêmeo, Heleno, ainda crianças, foram ao Templo de Apolo brincar. Os gêmeos brincaram até ficar demasiado tarde para voltarem para casa, e assim, foi-lhes arranjada uma cama no interior do templo. Na manhã seguinte, a ama encontrou as crianças ainda a dormir, enquanto duas serpentes passavam a língua pelas suas orelhas. A ama ficou aterrorizada mas as crianças estavam ilesas. Como resultado do incidente os ouvidos dos gêmeos tornaram-se tão sensíveis que lhes permitiam escutar as vozes dos deuses.

Cassandra tornou-se uma jovem de magnífica beleza, devota servidora de Apolo. Foi de tal maneira dedicada que o próprio deus se apaixonou por ela e ensinou-lhe os segredos da profecia. Cassandra tornou-se uma profetisa, mas quando se negou a dormir com Apolo, ele, por vingança, lançou-lhe a maldição de que ninguém jamais viesse a acreditar nas suas profecias ou previsões.

Cassandra passa a ser considerada como louca ao tentar comunicar à população troiana as suas inúmeras previsões de catástrofe e desgraça.

A falta de credibilidade das previsões e profecias de Cassandra levou à queda e consequente destruição de Tróia, quando esta viu frustradas as suas sucessivas tentativas de implorar a Príamo que ele destruísse o cavalo de madeira (Cavalo de Tróia) engendrado por Ulisses para a conquista de Tróia pelo seu interior.

Com a cidade já tomada pelos gregos, Cassandra refugia-se no templo de Atena, onde é descoberta e violada pelo brutal Ájax, filho de Oileu (a deusa haveria de vingar-se do guerreiro, posteriormente). Na partilha do butim de guerra, ela é dada a Agamenon, que a leva em seu navio, na viagem de volta à Micenas, onde ambos seriam assassinados por Egisto, amante da rainha Clitemnestra, esposa de Agamenon.

Fonte: Wikipédia

quarta-feira, 26 de maio de 2010

12

Quebrei os espelhos,
E o corredor ficou estranho,
Pois já não era a minha réplica
Que povoava as paredes.

A face se perdeu,
Escoada em fissuras,
Mandalizada em desníveis na superfície
do vidro.

Visões serão tidas como disparates,
Até que o beijo da Aranha petrifique o Sol,
Emaranhando as verdades perfeitas numa teia
de cianureto e monóxido de carbono.

sábado, 22 de maio de 2010

11

Talvez se eu aceitasse o convite daquele maçon
Algo saísse diferente.
Talvez, se eu caísse na lábia daquele thelemita crowleyano-edipiano
Eu estivesse mais calmo por trás de alguma bandeira
Por trás de alguma barreira ou quebra-mar
Que me ocultasse essa tormenta
Que me poupasse desse tornado
Deixando-me apenas uma brisa suave na face.
Tantos já engrossaram as fileiras da Santa Madre Igreja,
Tantos já sucumbiram a ordem prescrita na bandeira verde-loura
Da pátria madrasta velha e sádica (ou mãe gentil?).
Tantos já afunilados
Tantos moídos e picados em pedaços deglutíveis
Tantos feitos papa rala...

A escuridão cerca o herói,
Uma chuva pesada vai cair,
Mas ele se mantêm, intrépido,
Apoiado em sua estranha flâmula
Esfarrapada pelo embate.

quinta-feira, 20 de maio de 2010

10

Medusa: Rubens.


Lua crescente:
Lua propícia para investir no tirocínio,
Ou planejar um ilustre tiranocídio
Enquanto a maré cheia das ações
Levam gente fodida à bancarrota.

Fronteiras em sangue.
Os soldados fazem jus ao seu soldo,
Todos fiéis ao script, na lua crescente
Semi-plena.

o meu horóscopo diz que devo produzir.
Mais do que eu já produzo?!
Diz que devo semear.
Semear o que? Não há terra aqui,
E as frutas que restaram estão no merkkkado,
E as folhas tóxikkkas estão no mercado,
E eu mesmo estou no mercado
Produzindo e produzindo o velho lucro escroto.

O front e o poder estilhaçaram-se,
E agora estão em cada esquina.

Eu estou no cadafalso
E vejo a face do carrasco em cada homem e mulher,
E sangue grosso e quente escorrer pelas paredes.
O flower-power não deu certo,
O tiro de flor saiu pela culatra do cahimbo de haxixe
E ex-hippies são agora velhos neo-nazistas
Recrutadores de qualquer jovem lunátikkko
Que esteja disposto a esmagar uns crânios degenerados,
Tudo em nome da Humanidade Superior Melhorada.

Quando a última gota de espontaneidade estiver acimentada,
Quando o último e trêmulo graveto de individualidade for esmagado
Pelas botas militarescas da Ordem.
Quando o último sorriso verdadeiro for rotulado, classificado e tarifado,
Então será o fim.

quarta-feira, 12 de maio de 2010

Aos que sapateiam neste monturo.

Meus caros. Tentei fazer umas coisinhas visando organizar este monte de merda que me sai pelos poros involuntariamente, mas já desisti. Não tenho lá essas intimidades todas com o tal do blogger, a coisa foi embaralhando mais ainda, eu fui me estressando, e o resultado é que eu fiquei puto da vida. Sim, eu fico puto da vida com facilidade. Fumei uns 50 cigarros pensando em como separar a porra da minha produção de realismo fantástico, do que poderia ser considerado mais honesto e confessional, mas não tem jeito. Não consigo perder tempo com isso, afinal, ninguém lê nesta merda de Brasil, e não vale a pena esquentar muito a caixola. Portanto, a coisa vai ficando assim mesmo, como está, esta lama difusa e confusa, este pântano de sensações baratinadas embaralhadas abestalhadas embasbacadas, este mel amargo e podre, estas confissões de sub-literato. Se enquadrar em escola, e organizar escritos por gênero é para os filhotes bem-nutridos da elite, coisa de jovenzinhos rosados que têem o seu futuro sinanceiro garantido por alguma teta BEM suculenta, que vai o manter tranquilo e com tempo para suas efabulações bem-organizadas.
Além do mais, essa história de confessional/não confessional é uma boa de uma dicotomia imbecil-platonista. Tudo é confessional, meu PEIDO é confessional, minhas bandejas carregadas na choperia são confessionais. Afinal, que porra neste mundo não é confessional?
A coisa está aí, menos ou mais explícita, mais está aí, e NÃO É NON-SENSE!!!

terça-feira, 11 de maio de 2010

Eli, Eli, Lama Sebachtâni!*



- Você nunca tira essa boina?

Numa sala de sobrado abandonado. Com luz débil. Claude entrevistava o andróide, cada um numa extremidade da mesa carcomida.
- Sim, cinco vezes na semana, exceto aos domingos. Isto faz parte de um intrincado sistema metafísico-filosófico-esotérico-culinário.
- Culinário?
- Sim, é a trans-cozinha, uma forma de se alimentar somente de alimentos provenientes do Tibet.
- Você compra alimentos no Tibet?!
- Eu, não. O Grão-Comprador da OBOMMA (Ordem Boinista Oculta e Muito, Muito Antiga.)
- E ele só traz alimentos?
- Não. Traz também um sumo secreto que nos eleva a um estado místico-noético.
- Sei, e Noético vem de Noé...
- Não! Vem de Nous.
- E o que é o Nous?
- É o além do além onde não há aqui nem além.
- Vocês são tri-loucos!
- Quadri.
- Como?
- Na OBOMMA o Ser é visto como entidade quaternária.
- Quem fundou esta Ordem?
- O Neruda. E o Borges afundou. Pirandello e Gogol irão desafundá-la. Só assim o Ciclo se fechará.
- Pirandello e Gogol...
- Sim, morreram. Mas uma seita milenar fundada por um pithecantropus erectus vem protegendo os seus descendentes através dos tempos.
- A função deles é essa?
- A missão.
- Então, porque a tal seita foi fundada tão antes de Gogol e Pirandello?
- Nós não cremos no tempo.
- Explique melhor.
- Daqui não passarás.
- Como?
- Daqui não passarás. Daqui não passarás. Daqui não...ZIIIIIIIIIIIIUUUUUuuuuuuuummmmmmmmmm...

O APEM (Andróide Para Entrevistas com a Mídia) desligou-se completamente. Cabeça pendente, queixo tocando o peito.
Claude, o entrevistador, sentiu uma imensa vontade de tirar-lhe a boina cinza ajustada perfeitamente à cabeça.

Tirou.

No topo da cabeça do andróide, Claude leu, numa tela LCD (Liquid Cristal Display), o que não soube ser pilhéria, melodrama, non-sense ou mistério profundo:


PAI, POR QUE ME ABANDONASTE?
BIP BIP BIP!...A mensagem foi substituída por uma contagem regressiva em números vermelhos que começou do 10.
Claude, subitamente ciente do que se tratava, catou sua bolsa, a boina cinza, seu bloquinho, e saiu do sobrado abandonado em disparada.
A explosão se deu no exato instante em que Claude escondia-se atrás de um container de lixo, de onde fugiram centenas de ratos alucinados.

*Este conto faz parte de minha safra Cyberpunk. Estilo pelo qual sou apaixonado. O curioso é que quando dou vazão à veia Cyberpunk, não consigo evitar o humor, ainda que seja um humour-noir. Eu já publiquei este conto aquino blog, mas gostaria muito que os que acompanham este blog o lessem com mais atenção, de preferência escutando algum som pesado, e com a mente cheia de qualquer coisa que a arranque da vibração ordinária (esta ditadora sádiKKKa!). O caso é que eu gosto muito do que fiz neste microconto...

sábado, 8 de maio de 2010

Um Encontro


Aquela mulher era tão estranha. E o mais estranho era que não havia nada de estranho em sua aparência. Era mais uma mendiga enlouquecida pela miséria extrema, entre tantas outras que há no centro da cidade.
Ela me disse que se chamava Diana, e que nos encontraríamos mais tarde.

Agora não consigo dormir. Estou sentada na cama, assustada.
O ar do quarto está saturado do perfume dela.
E o mais perturbador é que, quando repasso o nosso encontro na mente, meu ouvido interno reluta em substituir "meu nome é Diana", por "meu nome é Diabo".

terça-feira, 4 de maio de 2010

9

Baralhos abertos em pernas,
Significando a atual conjuntura
Através de um signo mutante.

Eu sou um hieróglifo à deriva.
Sem coluna de fogo indo à frente,
Mas com o Faraó e seu exército no encalço.

Sabe-me a lava e a saliva,
-também os lagos de lama-
Putrefaço a passos largos, como tudo.

Ideogramo-me em versos esquizos,
Forjados no forno azul da paranoia
Onde dormem juntos Dragão e Fênix.

Eu sou o joio e o trigo
Tantralizando-se em sexo alquímico
Entre fendas de concreto.

Algo sobre terror noturno



Ok, my friends, aqui vai um repente num intervalo de aula, no estilo twiter.
Quando eu era criança, não dormia jamais com a luz apagada. Tinha um medo irracional do escuro. Mas não de qualquer escuro, mas do escuro da hora de dormir, quando eu sei que todo mundo dorme, e as fortalezas do mundo estão mais vulneráveis.
Cresci, consegui dormir com a luz apagada, mas algo mais terrível me atingiu. Por vezes eu acordava gritando, apavorado, totalmente indiferente a tentativas de consolo.
Uns dois anos após o início dos episódios, a minha família assistia ao Globo Repórter, que na ocasião falava sobre distúrbios do sono (e não sobre bichos ou dietas). Qual não foi a minha surpresa ao atravessar a sala e ver a cena que brotava da tela: um garoto mais ou menos da minha idade, de pé sobre a cama, gritava apavorado, totalmente indiferente às tentativas de consolo. Não era pesadelo, não era simples medo, senhoras e senhores, descobri-me portador de TERROR NOTURNO!

Eis a descrição enciclopædica:


Terror Noturno
Pesadelos são parte da natureza humana, entretanto, existe um tipo raro de fenômeno ameaçador durante o sono que não é exatamente como um pesadelo. Ele é chamado de "terror noturno"ou "Pavor Nocturnus" e é um severo distúrbio do sono, consistindo de ataques de terror agudo emergindo do sono profundo sem sonhos. É acompanhado por violentos movimentos corporais, agitação extrema, gritos, gemidos, falta de ar, suor, confusão, e em alguns casos, fuga da cama ou do quarto, comportamento destrutivo e agressão dirigida a objetos ou contra eles mesmos ou outras pessoas. Feridas, fraturas e lesões podem ocrrer em consequência.
O terror noturno ocorre durante a fase do sono não-REM, geralmente dentro de uma hora após o sujeito ir para a cama. Um episódio pode acontecer em qualquer lugar e durar de cinco a vinte minutos enquanto o sujeito ainda está sonolento. Os olhos podem se abrir. O paciente geralmente é incapaz de se lembrar de qualquer coisa após o acontecido.
Terror noturno pode coincidir com sonambulismo, em cujo caso andar e correr ocorre em conjunção com gritos, saltos e agitação violenta.
Durante o ataque de terror noturno, existe uma superativação do sistema nervoso autônomo simpático, incluindo dilatação das pupilas, sudorese, aumento nas taxas respirátórias e cardíaca, e aumento na pressão arterial. A taxa do coração (taquicardia) pode aumentar até 160 a 170 batimentos por minuto (o normal geralmente é de 60 a 100 no adulto), os quais são maiores que aqueles ocorrendo durante os episódios de estresse mais severos.
Fonte:http://www.virtual.epm.br/material/tis/curr-bio/trab2003/g3/terror.html

Pois bem, o caso ficou guardado como um segredo de família. Os episódios se repetiam duas a três vezes ao ano, e eu segui a vida aceitando mais esta esuisitice.

Eu jamais consegui me recordar de algo racional que tivesse provocado o pavor. Mas depois que me engajei em estripulias tântrico-psíquicas (e depois que li "A Ilha, de Huxley), resolvi tentar me reportar ao momento do episódio mais recente. Resultado: eu conseguia evocar o pavor em toda sua substancialidade. Pavor puro, com tudo que acarreta.
Mas durante tais experiências eu me mantia plenamente desperto (quem pratica zazen sabe o que isso significa), e jamais o episódio me "obsediou" enquanto eu estava em vigília, o que já me enquadraria numa esquizofrenia ou adjacências. A experiência REAL era inimitável.

Por volta dos 18 anos, eu já tinha lido muita coisa a respeito de técnicas do êxtase, enteógenos, xamanismo, respiração holotrópica, mito da MENTE NORMAL e afins. Não demorou para eu chegar à conclusão de que eu era assaltado por um estado não-ordinário de consciência, só que contra a minha vontade. Uma espécie de narco-anarco-transe não passível de indução.

Ante a total impotência da minha parte na direção de analisar, induzir ou julgar o fenômeno, deixei a coisa entregue ao laissez faire.
Nesse ínterim, foi-se desenvolvendo meu apreço por filmes de terror. Eu os assisti aos montes, até que um dia, na casa de minha avó, com meu tio Jorge, assisti ao filme "O Último Portal", de Roman Polanski. Decobri-me fascinado por aquele estilo de obra, cuja etiqueta de prateleira viria a descobrir mais tarde: Horror Psicológico.
Ora, não era justamente isto que eu experimentava durante os meus episódios noturnos? Um horror aparentemente sem justificativas externas a mim, um horror puramente psicológico? Como pesquisador ávido, e auto-didata voraz, não demorou para que me deparasse com o nome do senhor Howard Philips Lovecraft, o autor do seguinte recorte:

"A emoção mais forte e mais antiga do homem é o medo, e a espécie mais forte e mais antiga de medo é o medo do desconhecido. Poucos psicólogos contestarão esses fatos e a sua verdade admitida deve firmar para sempre a autenticidade e dignidade das narrações fantásticas de horror como forma literária."

O curioso é que nesse tempo todo eu jamais pensei em buscar a "cura" para a minha enfermidade. E em vez de correr atrás de obras e pesquisas que apontassem para a eliminação dos episódios, eu passei a me interessar mais ainda pela literatura do horror psicológico, considerando-a enteógenos verbais.



Aos 23 anos fui surpreendido por mais um episódio de pavor noturno, que teve a peculiaridade de durar mais que os anteriores.



No outro dia na velha tentativa de recordar proustianamente do ocorrido, me senti irresistivelmente movido a escrever. Claro que não tinha nada de objetivo a escrever. Escreveria qualquer coisa. Assim surgiu um poema que destoava de todos os espécimes da minha pequena monhtanha de versos adolescentes. A sensação geral evocada não se apresentava somente ao meu cérebro. Tomava-me por inteiro, e servia de combustível para os escritos. Mas é bom ressaltar que quando escrevo, não procuro deixar o leitor com medo, ou expressar em palavras o medo que senti. Mesmo por que não sei precisar a sensação dos episódios como MEDO. Inclusive percebo claramente a fronteira que separa a sensação do pavor noturno, do medo quotidiano que todos nós sentimos em meio à urbis.



Ainda hoje eu percebo que meus episódios influenciam de certa forma a minha escrita, que se tornou progresssivamente menos "realista" e explicitamente confessional. (Embora eu ache-a mais realista e confessional do que quase tudo que vejo em obras hodiernas). Mas tal influência não se dá mais como quando daquele episódio dos 23 anos, pois agora eu tento seguir o fio (torto) da meada de uma poética, e desenvolvê-la apartir disso.



E para os que acharem que eu estou apenas inventando uma patologiazinha visando parecer mais problematicozinho pseudo-lovecraftiano, perguntem ao quadrinista/escritor/desenhista/ilustrador Jorginho (http://bostamcity.blogspot.com/), que é meu tio, e presenciou o meu último episódio de terror noturno.



Abraço a todos, e fiquem com o tal poema pós-episódio de terror noturno:



Há visões noturnas,

há sonhos asfixiantes,

há gritos na madrugada

e a cama inundada em suor.

Mas àquele que vencer

será dado o Selo de Caim,

os Olhos da Serpente,

o Fogo Prometeico,

& a Cauda do Portador da Luz.

E ele habitará a Terra de Nod,

onde brotam nascentes

com a doce saliva de Sophia.

Mas cuidado,

os guardiões da Fonte são de fogo,

e seus gládios, impiedosos.

Declame a sentença correta,

e jamais esquecerás de quem tu és.





NOTAS:

1.Para melhor fruição do poema, pesquise sobre o mito do Rio Letes e seus Guradiões; Prometeu; e sobre o mito de Caim e a Terra da Fuga.

2.De tudo isso não decorre que minha produção é resultado de um processo simplista. Expus aqui apenas um recorte do meu processo de criação.

segunda-feira, 3 de maio de 2010

Robert Anton Wilson: Tornar-se O Que Se É



...vivemos em um mundo onde uma multiplicidade de forças muito poderosas tem atuado sobre nós. Do nascimento, passando pela escola, até o trabalho, tentam suprimir nossa individualidade, nossa criatividade e, acima de tudo, nossa curiosidade – em suma, destruir tudo que nos encoraja a pensar por nós mesmos.

Nossos pais queriam que nós agíssemos como as outras crianças da vizinhança; eles enfaticamente não queriam um menino ou uma menina que parecessem “estranhos” ou “diferentes”, tampouco “condenavelmente espertos demais.”

Então entramos na escola, um destino pior que a morte e o inferno combinados. Ao aterrissarmos em uma escola, aprendemos duas lições básicas: 1) Existe uma resposta correta para qualquer questão; 2) A educação consiste em memorizar essa única resposta correta e regurgitá-la nas “provas”.

As mesmas táticas continuam pelo ensino médio e, salvo em algumas ciências, até a universidade.

Através desta “educação” encontramo-nos bombardeados pela religião organizada. A maioria das religiões, no ocidente, também nos ensina a “única resposta correta”, a qual devemos aceitar com uma fé cega; pior ainda, tentam nos aterrorizar com ameaças de sermos queimados após a morte, tostando e fervendo no inferno se alguma vez ousarmos pensar por nós mesmos, de fato.

Depois de 18 a 30 anos de tudo isso, entramos no mercado de trabalho, e aprendemos a nos tornar, ou a tentar nos tornar, quase surdos, mudos e cegos. Devemos sempre dizer aos nossos “superiores” o que eles querem ouvir, o que veste seus preconceitos e/ou seus desejos fantasiosos. Se notamos algo que eles não querem saber, aprendemos a manter nossas bocas fechadas. Se não -

“Mais uma palavra, Bumstead, e você está despedido!”

Este rebanho humano começou com gênios em potencial, antes que a conspiração tácita da conformidade social enferrujasse seus cérebros. Todos eles podem se redimir dessa liberdade perdida, se trabalharem duro pra isso.

Eu trabalhei por isso por 50 ou mais anos até agora, e ainda acho partes de mim agindo como um robô ou um zumbi em algumas ocasiões. Aprender a “tornar-se o que se é” (como na frase de Nietzsche) leva o tempo de uma vida, mas ainda parece ser o melhor a se fazer.



Robert Anton Wilson


"A única sociedade possível é a dos amantes."

Rammed Rahab

Um fragmento de Hakim Bey sobre Max Stirner

"A tradução do título (e palavra-chave) da obra magna
de Max Stirner como ”O ego e o que a ele pertence”levou a uma sutil interpreta¸cão errônea de ”individualismo”. O termo anglo-latino "ego", vem carregado e oprimido com uma bagagem freudiana e protestante. Uma leitura cuidadosa de Stirner sugere que ”O Único e seu Próprio” refletiria melhor suas intenções, dado que ele nunca define o ego em oposição à libido ou ao id, ou em oposição à ”alma” ou ”espírito”. O Único (der Einzige), pode ser melhor construído simplesmente como o ”eu” individual."

Hakim Bey

Quem viu aquele filme...não sabe o que é constantine!





"[...]um vigarista de língua afiada, um mago aplicado, um punk sarcástico e um completo canalha."

Assim constantine está descrito no site da Devir, a sacrossanta editora graças à qual eu hoje posso deleitar-me com esta obra prima de Mr. Carey e CIA.



Repente irado dentro do ônibus em meio a um engarrafamento dantesco (eu lia "Caos, Terrorismo Poético e Outros Crimes Exemplares, de Hakim Bey)

Esses 'istas' da "esquerda" acham que conhecem o mundo porque o leram e tem uma cara feia de adorador de O capital, ou de qualquer livro que fale sobre libertar os oprimidos dos opressores.

Libertem-se vocês de toda merda que vocês são antes de querer libertar o mundo. Vocês, OS GRANDES INTELECTUAIS, não se sentem o opressor porque não detém o capital, nem o oprimido porque vocês leram muitos livros e vocês são os únicos do mundo que leram muitos livros, vocês são os únicos capazes de fornecer a receita da liberdade, vocês são um Deus ateu, um Cristo, um Moisés, uma entidade bíblica fantástica iluminada que tudo sabe e tudo vê e que guiará a humanidade pelo caminho da verdade, da luz e da liberdade.

Vocês são uns patéticos. Vocês são uns CAGÕES. "Caos, Terrorismo Poético, e Outros Crimes Exemplares" são pra quem sabe que sonha, não pra quem acha que vive. São pra quem entende de ilusão e não pra quem entende de materialismo ou dialética ou punheta ... E o Terrorismo Poético ainda vai sabotar essa existência vulgar que vocês chamam de realidade.

sábado, 1 de maio de 2010

Repentes

Acho curioso quando alguém me pergunta se faço arte realista ou não.


Quando é que esse povo vai entender que nenhuma arte é o espelho límpido da realidade?


Não é que não haja realidade. O caso é que arte é tão realidade quanto meu pau, entende? Realidade autônoma. Há infinitas realidades, todo mundo sabe disso, mas tem medinho de encarar a vertigem que isso dá. Assim nascem os fascistas e sua eterna busca pelo Eterno-Uno-Verdadeiro-Perene-Papai, e seu ódio figadal pela Natureza/Mãe.


Sobre a mente Fascista, leia:








Você acha que Flaubert espelha a tal realidade? Ou Machado de assis?


Toda arte que se preze traz em si o germe da transgressão.


Sobre essa "mania de espelho" ocidental, recomendo a seguinte obra:
RICAHRD RORTY. A Filosofia e o espelho da natureza.

Eu não escrevo coisinhas doidinhas e non-sense. Eu penso meus poemas e contos, e lido com linguagem mitológica e mística por um motivo bsatante racional: fui criado numa seita evangélica, e lá em casa só tinha Bíblia para ler. Resultado? Descobri o Apocalipse, e o li mais de trezentas vezes (encantado a cada leitura!).
Deu no que deu. Me expresso nma linguagem marcadamente místico-religiosa, mesmo quando ataco a religião e o tal misticismo.
Mas está tudo aí, é só ler. Política, psicologia, rebelião, oscambauaquatro.

Agora, mais lametável do que alguém que escreve coisas nen-sense para achar-se/parecer rebelde ou libertário, é quem escreve realismo chinfrim para se sentir rebelde ou libertário.

Veja, tem gente por aí que a cada dez palavras, 11 são "puta, asfalto, ônibus, botei um disco na vitrola". O engraçado é que quase ninguém tam mais a porra da vitrola, mas é chique ser retrô...

Sobre essa mania de imposição totalitária-narcísica de modos de ser e produzir, há um recorte do Thoreau:

"Se um homem marcha com um passo diferente do dos seus companheiros, é porque ouve outro tambor."

Bom, esses foram os meus repentes à la Baudelaire. Um abraço do seu amiguinho, câmbio, desligo.


quinta-feira, 29 de abril de 2010

MURAL: H.R.Giger

H.R.Giger, Dark Water

Jorginho

Bostam City
As tiras de Jorginho, e o seu anti-herói combatente da seriedade malsã que viceja em nossa sociedade.

Allan Moore







Alan Moore nasceu em 18 de novembro de 1953 em Northampton, Inglaterra, uma cidade industrial situada entre Londres e Birmingham.

Filho mais velho do funcionário de uma cervejaria, Ernest Moore, e da tipógrafa Sylvia Doreen, Moore teve uma infância e uma adolescência bastante influenciadas pela pobreza da sua família e do seu ambiente.

Ele foi expulso de uma escola secundária conservadora e não foi aceito em qualquer outra escola. Assim, em 1971, Moore estava desempregado e sem possuir qualquer qualificação profissional.

Moore começou a trabalhar com a Embryo, uma revista que tinha publicado com amigos. Isso fez com que se envolvesse com o Laboratório de Artes de Northampton. Depois, casou-se com Phyllis em 1974, tendo eventualmente duas filhas, Amber e Leah.

Em 1979, Moore começou a trabalhar como cartunista para a revista semanal de música Sounds, onde escrevia e desenhava uma história de detetive chamada “Roscoe Moscou”, sob o pseudônimo de Curt Vile.

Eventualmente, Moore concluiu que era um ilustrador fraco e decidiu focalizar seus esforços apenas em escrever. As suas primeiras contribuições foram para a Doctor Who Weekly e o famoso título de ficção ciêntífica 2000 AD, na qual criou várias séries populares, como A Balada de Halo Jones, SKIZZ e D.R. & Quinch.

Em seguida, Alan Moore trabalhou para a Warrior, uma revista britânica de antologias. Foi nesse título que começou duas importantes séries: Marvelman (rebatizado nos Estados Unidos como Miracleman) e V de Vingança, o subversivo conto sobre a luta por liberdade e dignidade numa Inglaterra fascista. Ambas lhe conferiram o British Eagle Awards, como Melhor Escritor de Quadrinhos em 1982 e 1983.

Os talentos de Moore lhe garantiram a sua primeira série americana, a saga do Monstro do Pântano. Nela, o conceituado escritor reinventou o personagem, enquanto seu enredo girava em torno de temas pesados (controle de armas, racismo, lixo nuclear, etc).

Exibindo grande profundidade e perspicácia em seu trabalho, ele demonstrou que podia escrever sobre um amplo leque de tópicos e situações. As histórias dele fixaram o passo para o chamado “Suspense Sofisticado”, através do qual a maioria das HQs da linha Vertigo da DC opera atualmente.Além de Monstro do Pântano, escreveu também vários outros títulos da DC, um anual do Batman e algumas histórias do Superman.

Em 1986, enquanto a DC Comics estava reconstruindo seu universo de quadrinhos, Moore escreveu Watchmen, que, ao lado de Batman: O Cavaleiro das Trevas, de Frank Miller, redefiniu o meio dos quadrinhos, e mudou o tom dos quadrinhos da época. Watchmen, com seus enredos detalhados, mostrava um retrato realista dos super-heróis num mundo que nem os entendia, nem confiava neles, e é até hoje considerada por muitos a maior HQ de super-heróis de todos os tempos.

Ele terminou suas histórias para o Monstro do Pântano, completou V de Vingança para a DC Comics e escreveu uma das melhores histórias do Coringa em Batman: A Piada Mortal (com arte de Brian Bolland). No final do anos 80, Alan Moore estava muito descontente com o fato de não possuir os direitos de Watchmen, assim como achava que não estava recebendo os royalties adequados pela série.

Além disso, nessa época surgiram discussões sobre a implementação de um sistema de classificação nas revistas em quadrinhos e Moore era totalmente contra essa idéia. Assim, ele resolveu deixar os quadrinhos mais comerciais e populares para trabalhar estritamente para editoras menores e independentes.

Sem mais nenhum vínculo com a DC, Moore começou vários projetos. Em 1988, montou a sua própria editora, chamada Mad Love Publishing. Moore começou a trabalhar num roteiro de cinema com o empresário da banda punk Sex Pistols, Malcolm McLaren, chamado “Fashion Beast” (embora o filme nunca tenha saído do papel).

Ele também começou a série Big Numbers, com artista Bill Sienkiewicz; mais duas séries para a Taboo, de Stephen Bissette: uma chamada Lost Girls, com a artista Melinda Gebbie, e a série Do Inferno, com Eddie Campbell. Moore também fez uma história pessoal intitulada A Small Killing, com o artista Oscar Zarate. A publicação independente, entretanto, não foi uma coisa muito boa para Moore. Dos trabalhos que começou nesse período, apenas A Small Killing e Do Inferno foram concluídos.

Posteriormente, Moore foi trabalhar na Image Comics, uma nova companhia de quadrinhos dirigida por um grupo muito popular de jovens artistas e escritores. Nessa editora, Moore escreveu 1963, uma espécie de reparação pelas péssimas histórias de outros escritores que brotaram na mídia dos quadrinhos como conseqüência de Watchmen. Ele também escreveu várias histórias para o personagem Spawn, criado por Todd McFarlane.

Nesse período, seu trabalho mais precioso talvez tenha sido a renovação da série Supremo, uma criação de Rob Liefeld calcada no Superman. A abordagem de Moore para o personagem foi tão nostálgica, quanto criativa, voltando no tempo até os primórdios da DC Comics. Infelizmente, a série foi suspensa por causa de problemas financeiros e os dois últimos números jamais foram publicados.

Então, Moore criou seu próprio selo: America’s Best Comics (ABC) para a WildStorm, o estúdio de Jim Lee, da Image Comics. E, mais uma vez, o talentoso escritor pavimentou todo um território diferente com várias novas séries: A Liga Extraordinária, Promethea, Tom Strong, Tom Strong’s Terrific Tales, Tomorrow Stories e Top Ten.

Ironicamente, a WildStorm acabou sendo vendida para a DC Comics e Jim Lee teve que acertar alguns detalhes contratuais com Moore para que não existisse nenhuma ligação entre ele e sua antiga editora.

Recentemente, o polêmico roteirista se desligou da DC/Wildstorm por causa das interferências da editora no seu trabalho. A DC detém todos os direitos dos personagens da ABC, exceto ‘A Liga Extraordinária’, que é propriedade de Moore e Kevin O’Neill. O terceiro volume da série deverá ser publicado pela Top Shelf Publishing.

Outros projetos de Moore incluem CDs e livros... além do seu desejo de se tornar um mago. Alan Moore mora em Northampton, Inglaterra.






Fonte:http://www.devir.com.br/hqs/moore.php


texto traduzido por: Marquito Maia
texto original: Alan Moore Fan Site

quarta-feira, 28 de abril de 2010

8




Segredos são submarinos,
Engastados na superfície interna,
Refulgindo para dentro,
Revelando o escuro.

Sibliações são subversivas,
Agradam a poucos,
E seu ruído estranho
Ameaça ruir antigas formas (trovejantes).

Sete sombras sem semblante,
-semantemas sem sentido?-
Só para quem é surdo,
Só para quem é insensível.

Faço cantos para sensitivos
Que habitam as sombras selváticas,
Erráticos insurectos,
Partilhando sob insuspeitos tectos
O Sol Vermelho, a Hóstia Cega,

Salivando lava.

Poemas de Livros Hipotéticos: Fragmentos de Mäsdul.

Tudo aqui são cacos
Desde que Mäsdul agiu com cegueira.
Aqui jamais foi diferente,
Aqui reina a loucura de Mäsdul e seus Regentes.
Somos filhos de Mäsdul,
Ele dorme em nossas almas
E seus sonhos febris somos nós,
Nós e tudo que existe neste quarto escuro.

Somos crias sa cegueira,
Cacos de Absurdo,
Sinfonia cacofônica.

A Mãe tentou entrar,
Mas espatifou-se entre espinheiros ardentes.

Um homem viu um estilhaço, uma vez,
Ele ardia no meio de uma moita
Que não consumiu,
Mas um Espia de Mäsdul flagrou o encontro
E Ele reforçou a guarda (os Nephlins).

Não há salvação para nós.

Zaghar, o Velho, cinco dias longe de Mäsdul. O Arqueiro se foi, e eu acho que não vou durar muito. Estou andando em círculos desde o dia em que o meu bravo companheiro disparou a sua flecha no abismo.

7


Kalki




Eu lembro quando as Vigas do Mundo rangeram.
Semblantes enfezados brotaram do solo fendido
em veias abissais.

O Rei do Mundo então ergueu-se,
Emergindo da areia do Gobi.
E da Refulgente Estrela no seu peito
Saiu um cavaleiro num cavalo branco.

Era Kalki, o último de todos.

Quando seu cavalo tonitroou,
os átomos embaralharam-se.

Quando desembainhou sua espada flamígera,
tudo fez-se em lava,
tornando clara a Matéria Escura,

Então os Guardiões do Éden puderam descansar.

segunda-feira, 26 de abril de 2010

sexta-feira, 23 de abril de 2010

Poemas de Livros Hipotéticos: Fragmentos de Mäsdul. Canção da Sacerdotiza Norea (encontrada num fragmento de vaso)

Arranca uma chuva de mim.

Crucifica-me num graveto
cem vezes seguidas,
até que já não haja vento
ou véu de templo.

Eu sou
um signo vazio
e descascado,

arbusto
dando adeus

ou semblante descaído
de um titã
fossilizado.

quinta-feira, 22 de abril de 2010

Galeria dos Espelhos Quebrados: Sidney Herbert Sime


sidney sime, inzana invokes the thunder, 1906.

Fragmentos de Mäsdul: NAHASH




Meu veneno é Zoe
E nem sempre foi letal.
Há um Éon além do Vale dos Espinhos Ardentes
Onde copos do meu sumo é partilhado numa seia orgíaca
Junto com um prato de escamas caídas de cem mil olhos.

Meu veneno é Zoe,
E Norea é meu nome.
Com as pedras que um dia me atiraram
Eu refiz meu corpo,
E renasci como torre coroada
Sob a alcunha de Mágdala.

Os homens sempre me pintarão e esculpirão
Empunhando a Serpente, o cálice,
Ou ostentando peitos fartos.
Estes são os três receptáculos de Zoe,
O Veneno que é salvação
Quando a trave sai do olho
E quando cessa a espessa lama de Mas Allá.

terça-feira, 20 de abril de 2010

Aviso aos visitantes

Informo aos meus visitantes que doravante eu só escrevo poesia confessional e reclames afins nos meus cadernos particulares, podendo até chegar a mostrar a amigos e chegados.
Este blog abrigará minha produção no campo da literatura radicalmente não-realista, pela qual sou fascinado.
Não é de hoje que escrevo esse tipo de literatura, que me proporciona imenso prazer em fazê-la. O caso é que só agora tive cara de pau suficiente para publicar esse ipo de coisa.
Tenho plena consciência de que com essa decisão eu me afasto mais ainda dos "poetas sérios" e "leitores sérios", e me circunscrevo num pequeníssimo círculo de apreciadores, isso caso este pequeno círculo venha a me conhecer.

Tenho respeitado cada dia mais o Prazer.

Apesar de extremamente caótico à primeira vista, o blog pode ser melhor fruído se o leitor valer-se dos marcadores, que aqui se chamam "SONHOS NA TEIA". Aqui vocês poderão ler grupos de poemas (que eu chamo de "Livretos") que de alguma forma guardam uma coerência entre si, além de algumas histórias mais lineares que publicarei ao longo do tempo.


QUANTO AO "CONTEÚDO": Explicações às viúvas de Stálin e Jdanov.

Os necrofílicos da Arte, e os que acreditam na dicotomia Forma/Conteúdo devem manter-se longe deste blog.

Eu realmente não sei precisar o que nesses opúsculos é forma, e o que é conteúdo. O fato é que são signos linguísticos postos em rotação, portanto plenamente passíveis de interpretação. Mas dou-me por satisfeito se tais escritos proporcionarem prazer aos leitores. Portanto, também deveriam evitá-los os que cobram do artista um discurso explicitamente "social", "engajado" (liberanos Domine!), ou coisa que o valha.

sexta-feira, 16 de abril de 2010

Repente

Quando eu era mais jovem, cheguei a sonhar em "publicar um livro". Então um belo dia descobri que publicando um livro, eu estaria na verdade privatizando a minha poesia, tornando-a acessível a um nicho de pequeno-burgueses que têm dinheiro o suficiente para adquirirem este bem.
Então veio a Internet.
Agora, me dou por satisfeito. Publico (de fato) isso que na verdade na verdade, não é POESIA, mas livretos desintelectuais influenciados por cultura pop, rock, beatniks, paganismo e filmes de horror psicológico.
E está aí, acessível a qualquer cidadão do mundo.
Não tenho mais sonho algum referente à literatura.

Fragmentos de Mäsdul: Ishtar Fala.



Eu vi quando o Sol se partiu.
O brilho roeu os ossos, estupefez as faces,
e os barcos de prata fugiram em debandada
com mulheres e crianças nos seus ventres
(além da Rainha e seus escudeiros).

Eu estava longe.
Eu vi tudo num espelho.
Eu parti o Sol de Mäsdul.


Hoje cada semi-esfera sua
vaga pelo espaço,
e eu verei quando se re-encontrarem.

Eu tenho os meus motivos,
ninguém entenderia,
nem eu mesma entendo bem,
talvez eu só quisesse saber
até onde eu queria chegar.

Talvez eu só quisesse chegar a algum lugar.

Talvez eu só quisesse Saber...

Eu parti o Sol de Mäsdul.

quinta-feira, 15 de abril de 2010

R.I.P. Peter Steele (explicações)

A postagem em homenagem a Peter Steele está tão desarrumada pois estou blogando de uma lan-house fuleira, onde eu soube da morte do Peter.

R.I.P. Peter Steele. Jan.1962-Abr.2010



Peter Steele (nome artístico de Peter Ratajczyk), (4 de janeiro de 1962 - 14 de abril de 2010)Foi o vocalista e baixista da banda Type O Negative. Da qual eu sou mais que admirador. Ao que tudo indica Peter morreu vítima de um ataque cardíaco.
Eu, do contra que sou, admirava(o) muito mais o Peter do que os aclamados Dylans and Cashes and Williams, tão caros aos poetas e intelectualóides.

Boa viagem ao Desconhecido, Peter. Lucifer te espera par umas boas noitadas nos rocônditos do inferno!

Segue um vídeo da minha canção preferida do Type O Negative:

6

Arranca uma chuva de mim.

Crucifica-me num graveto
cem vezes seguidas,
até que já não haja vento
ou véu de templo.

Eu sou
um signo vazio
e descascado,

arbusto
dando adeus

ou semblante descaído
de um titã
fossilizado.

5

Imerso no silêncio da noite

Vagueio pela página em branco.

Já não sei o que procuro,

São tantas árvores e homens em cada linha azul...

O grilo trila,

E faz poesia melhor do que eu,

Sua arte é completa!

terça-feira, 13 de abril de 2010

Algo de Nietzche para os Poetas (sobretudo os contidos)


Para que haja arte, para que haja alguma acção e contemplação estéticas, torna-se indispensável uma condição fisiológica prévia: a embriaguez. A embriaguez tem de intensificar primeiro a excitabilidade da máquina inteira: antes disto não acontece arte alguma. Todos os tipos de embriaguez, por muito diferentes que sejam os seus condicionamentos, têm a força de conseguir isto: sobretudo a embriaguez da excitação sexual, que é a forma mais antiga e originária de embriaguez. Também a embriaguez que se segue a todos os grandes apetites, a todos os afectos fortes; a embriaguez da festa, da rivalidade, do feito temerário, da vitória, de todo o movimento extremo; a embriaguez da crueldade; a embriaguez da destruição; a embriaguez resultante de certos influxos meteorológicos, por exemplo a embriaguez primaveril; ou a devida ao influxo dos narcóticos; por fim, a embriaguez da vontade, a embriaguez de uma vontade sobrecarregada e dilatada. — O essencial na embriaguez é o sentimento de plenitude e de intensificação das forças. Deste sentimento fazemos partícipes as coisas, contragemo-las a que participem de nós, violentamo-las, — idealizar é o nome que se dá a esse processo. Libertemo-nos aqui de um preconceito: o idealizar não consiste, como se crê comummente, num subtrair ou diminuir o pequeno, o acessório. Um enorme extrair os traços principais é, isso sim, o decisivo, de tal modo que os outros desapareçam ante eles.

Friedrich Nietzsche, in "Crepúsculo dos Ídolos"

Uma do Henry Miller


Parece-me a mim que o pressuposto em que se baseiam as acções restritivas dos nossos guardiões morais é simplesmente o de que o acesso à literatura proibida nos pode levar a comportar-se como animais. Mas pensar assim é insultar o reino animal. E, ao mesmo tempo, transformar paixão, o maior atributo do homem, numa caricatura. A gama da paixão humana é quase ilimitada, atingindo alturas e profundidades impensáveis. Precisamente por abarcar tais extremos é a paixão a autêntica pedra de toque da nossa humanidade, e talvez também da nossa divindade. De todas as criaturas da terra, o homem é a única de comportamento imprevisível. Há em nós alguma coisa de toda a criação. Quando nos é negada a menor parcela de liberdade, ficamos espiritualmente limitados e mutilados. É a plena consciência da nossa natureza múltipla e a integração da miríade de elementos de que somos compostos que nos faz completos, que nos faz humanos. A religião faz de nós santos, ou apenas bons cidadãos, mas o que faz de nós homens, o que nos faz humanos até ao âmago, é a liberdade. É uma palavra terrível, a liberdade, para aqueles que viveram toda a vida mentalmente algemados.

Henry Miller, in "A Obscenidade na Literatura"

Visitem: O Campo dos Girassóis

Ainda há poetas de carne e osso na terra da alegria. E esse é um deles. Leiam as palavras do senhor Juan Leon:

http://ocampodosgirassois.blogspot.com

sábado, 10 de abril de 2010

Poemas de Livros Hipotéticos: Fragmentos de Mäsdul, O Arqueiro e o Abismo

Retesou seu arco.
Semicerrou os olhos.
Cantou aquela velha cantiga
que aprendera com os xamãs
em Mäsdul:

" Vento, vento
que dá na trilha
Chuva, chuva
que dá na ilha
Sol de Agosto
luz sombira
Vultos magros
girando a quilha..."

Quando toda a sua força estava condensada
estancada no braço esquerdo
e a mão direita, intrépida
roçava a barba e o lóbulo da orelha

cerrou os olhos
soltou a corda
e a seta singrou o breu sanguíneo
das pálpebras cerradas.

O que viu a Águia:
Um homem à beira do penhasco
de calças esvoaçantes, tronco desnudo,
o rio rugindo ao pé da encosta,
o arco pendente,
os olhos cerrados,
a face beatífica.

O que não vui a Águia:
Uma flecha cravada
na noite escura
do Arqueiro.

quinta-feira, 8 de abril de 2010

4



VI.
o que tanto buscamos
vidrados nas janelas do ônibus?

buscamos outros de nós,
outros olhares,
os semelhantes que passam
ao nos ver passar,
os que concorrem no páreo insano
das naus de lata?

eu busco tubérculos num céu azul,
brócolis enfiados em vaginas celestes
espreitando o mistério de tudo
enquanto abóboras guerreiam por território,
ovos fritos, saladas de olhos,
vísceras enroladas em garfos-esqueletos,
escorrendo mel,
chovendo mísseis dulcíssimos
explodindo unhas de Fênix.

um estilhaço roça a face.
o corte sangra um pouco,
mas arde faca apimentada
de vazio desértico.

o Raquítico passou por aqui,
e também o Opiólatra
e o Morfético,
os três, profetas
(olhos gastos de ver abismos
e sarças ardendo,
estas, circundam suas cabeças
como elétrons selvagens).

VII.
Micha-el é um elemento químico.
outros anjos também,
mas alguns são misturas e reações,
sobretudo psicológicas.

VII.
pobre Fênix!
pousou, desavisada,
em uma rua de Salvador,
e foi brutalmente estuprada
e executada em seguida.
por quem, não se sabe,
(estão periciando as balas)
mas no jornal
um ilustríssimo defensor dos nossos corpos
afirma, categoricamente, o motivo:
a Fênix tinha associação com o tráfico de elixires.

pobre Fênix,
tinha palavras de fogo a nos anunciar,
mas foi precocemente calada,
na calada da noite,

e doravante cada poça
é uma lágrima de
Chuang Tzu.

quarta-feira, 7 de abril de 2010

Mural: Manet


Edouard Manet: Suicide, 1877

Poemas de Livros Hipotéticos: Fragmentos de Mäsdul, O Neófito.

IV.
nós habitamos o degredo

vivemos entre as najas

e aprendemos a dialogar com o deserto.

uma quilha de navio espatifou nossos crânios

e desde então miríades de demônios brotam de lá

-caleidoscópicas borboletas do Abismo-,

e a Prudência jaz, inane,

num mar de lodo e fígados podres.

V.
eu sou Samyazah,

o Pão que o Diabo amassou.

aquele outro é Yesod-Malkuth,

e o grupo que se alberga à sombra raquítica daquela árvore

é a esfomeada cria de satã.

eles envenenaram o Rio que brotava do Trono de Deus e do Cordeiro,

fazendo murchar a Nova Jerusalém.

Nós somos as Jóias favoritas

da Grande Meretriz.

3

III.
não quero a pudicícia que sangra aos poucos

gota-a-gota

milimetrando, auferindo,

jamais se ferindo,

vivendo em pausas para o cafezinho.

quero a virulência satânica

dos que sorvem lava aos largos goles

e chutam para longe o cachorrinho advertente.

estranhas borboletas,

sibilas proféticas,

flores bélicas

no seio da pasmaceira instituída.

segunda-feira, 5 de abril de 2010

2

II.
Se pedires com afinco
O Demônio do Fogo pode aparecer-te
Sempre à noite
Sempre em Junho.

Vais tremer ante a sua estatura
Vais correr rumo ao Velho Livro
Vais rezar por perdão divino
Vais tentar girar a maçaneta

Mas o que foi feito
não pode ser desfeito

O Esquecido irá sentar-se na nuvem
E teu quarto desaparecerá
E estarás em meio às estrelas
E à dança das galáxias

Então serás apanhado pela cintura
Cingido fortemente pelos dedos em chamas

E a dor será lascinante
E o que a ti será dito ao pé do ouvido
com voz de lava sibilante
estarrecerá vossas entranhas

E enjoarás

E vomitarás os Cânticos de Deus
E suplicarás clemência
E tua carne se rebelará em frêmitos e ardores

E despertarás suado
No leito inóspito que a pobreza te legou
Com a alma opaca que aceitou naufragar ao teu lado
e que chamas de esposa

E terás gravado a ferro no peito
o Signo Vermelho

Que contém em si a exata medida da dor e desespero
que perpassam cada vida humana

E então verás

Em limpidez de lago estático

Que não há esperança

Que não há esperança...

quinta-feira, 1 de abril de 2010

Poema Sazonal: Chuva de Outono


Foto por Rafael Medeiros

Ovos de água caem com a chuva,
eclodindo em telhados,
em poças, em chãos.

Alguns fazem bolhas
de ar e água...
mas a chuva é tão fogosa!

E não são chamas que crepitam
aqui e ali
onde os ovos eclodem?
Ou coroas de vidro
palpitando em síncope...

Chove pesado,
e o que escuto
são ovos postos por Verão,
de onde nasce, pouco a pouco,

Outono.

01/abril/2010